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quinta-feira, 16 de agosto de 2007

Ying e Yang, Luz e Escuridão...




“Eu entro. Usando apenas o som dos meus passos como lanterna!”
Triste, ainda que poeticamente esperançoso, escrevendo essas linhas, início esse capítulo pelo final – ou meio.
Volto do trabalho mais cedo naquela segunda. Ainda é dia... E um dia não muito quente e ensolarado. Caminho pelas ruas estreitas até el metro. Atravesso uma praça, antes, com um enorme espelho d’água, cruzo, por uma passarela, uma linha ferroviária, uma enorme e linda catedral modernista... Caminho por uma rua de asfalto romano e chego a estação. Decido ir a la rambla (FOTO), olho umas lojas de instrumentos musicais, as pessoas, e ao cabo disso tudo, volto para casa.
Ainda é dia.
Curiosamente, a luz do sol toca o solo espanhol às seis de la manhana e se despede as diez de la noche.
– Estamos sem luz! – ouço de irmão, ainda com a chave do apartamento na porta.
Mas é cedo... segundo ele e Eliza – uma italiana que vivia no outro quarto – os tecnicos haviam dito que, antes de anoitecer, o serviço elétrico estaria restabelecido em nossa região. Ótimo, largo minha pasta sobre a cama, termino de ler as últimas paginas de La Momia e caio num cochilo rápido. Um momento depois, Rodrigo, meu irmão, me acorda.
– Vem, vamo no mercado!
Desçemos a lomba que é nossa rua, e um pouco depois, estavamos em frente ao Dia, o mercado mais barato da regiao. Uma placa nos surpreende:
“Fechado, por falta de energia eletrica!”
A mudança de rumo nos levou a outro Dia, em Joanic, em frente ao Passeig Saint Joan – onde, entre outros, figura um pequeno monumento com estátuas de Chapéuzinho Vermelho e o Lobo Mau.
Ao terminarmos as compras (incluidas duas Xibecas de litro a 1 euro cada – foto –, morram de inveja) já havia quase anoitecido. Em casa, percebemos estarrecidos que os técnicos estavam enganados. Estávamos sem luz elétrica e quase sem luz solar.
Um pouco aborrecido, vou até uma praça onde espanhóis pensam jogar futebol, e alí fico até a escuridao cobrir tudo o que os olhos alcaçavam. Volto para o apartamento, pensando no disperdício que é tomar cerveja quente...
"Entro, usando apenas o som dos meus passos como lanterna!"
Mentira... uso também o celular. Juan, o frances que mora conosco se despede cedo. A não ser pelo conversa, em castelhano, entre meu irmao e Eliza na habitaçao da italiana, o resto repousa no mais profundo silêncio. Chego à nossa habitaçao. De frente para o prédio existem dois outros prédios... A luz do dia, os vejo da minha janela. Agora só posso divisar as luzes das velas em alguns apartamentos, diversas como numa árvore de natal.
Deito em minha cama, posso ver um largo canto do céu. Escuro. Penso nos dias difíceis do começo... sinto a solidao me olhando do escuro mais profuso do quarto... penso nos amigos, na família... adormeço.
Num segundo depois acordo com um estridente panelaço.
Revoltados com a situaçao de não ter luz, aparentemente nova para o povo daqui, e prevendo que a noite se resultaria nisso, as pessoas da “vizinhança” sairam às suas varandas e começaram, literalmente, a bater panela...E o panelaço se foi longe, entre gritos de “Revolution!” do Rodrigo e buzinaços dos carros que passavam...
- É um forma de protesto - explica meu irmao - começou em Buenos Aires, na guerra do Iraque!
Acompanhavamos tudo, tomando cerveja, na habitaçao de Eliza. A duração disso foi pouco mais do que uma hora...Vencidos pela escuriadao, os espanhóis vizinhos rendiam seus panelaços ao silencio, aos poucos. Até nao sobrar som algum...Era a cena mais deprimente, desde a minha chegada a espanha. No escuro, bebendo cerveja quente e jogando no celular, enquanto meu irmão seguia trovando uma italiana que media duas vezes o tamanho dele na largura. Triste mesmo, foi na hora de ir ao banheiro. É a maior humilhaçao do ser humano, penso comigo... A bateria do celular se entrega de vez.
Entao Rodrigo pergunta a Eliza se ela tem preferencia por algum seriado.... (Chegamos ao ápice - alguns podem naum perceber. Bem aqui, agora, atravessamos o Ying e o Yang, a mudança.... É quando as coisas começam a caminhar para a escuridão eterna.) Segue:
...Ao que ela responde que gosta de Sex on the City e O.C.
Acabo no banheiro, mas antes escuto o comentario em castelhano: “Nah... Eu não consigo entender Sex on the City – Rodrigo diz – parece os filmes do Woody Allen do início dos anos oitenta... E O.C., pelo que parece, está acabando, hein!!! Andei vendo na internet que a Marissa morre no final da terceira temporada..."
Será que eu entendi bem?!
Alguém percebeu o elo perturbador da mudança?
Certo, O.C. pode não ser uma série fantástica.... Mas a dita cuja, falecida é uma das mocinhas da série, criada e desenvolvida para terminar o sériado com o mocinho, estou enganado?...
A realidade me acerta como um choque.
O que, pelo amor de deus, perpetua, se o que era pra ser definitivo passa?O que, entre luz e sombra, é real e o que nao é?A escurido da noite se vai... o dia chega... a luz eletrica volta no final da tarde.
Tudo, ao que parece volta ao normal... Será... Daqueles planos que a minha vontade projeta no horizonte do outro dia, quais expectativas serão concretizadas, quais serão abraçadas pelo esquecimento?
De volta a minha cama, a solidão de seu acampamento negro conversa muito com as dúvidas que se chegam.
Durmo, levanto, durmo, levanto....
A escuridão de Barcelona nunca passa.
Chega a um ponto em que percebo: A decisao é minha, fico para trás ou continuo andando...
"Respiro fundo e entro na escuridão. Usando apenas o som dos meus passos como lanterna."

5 comentários:

Unknown disse...

dae meooooo.....
sem energia eletrica..hauahuahuah.....
aposto q lembrou dos tempos da "matchaca"...hauhauhauhau....
q tri cara...
baixou a tina nos loko...da-lhe panelaço....hauhauhauha...
abraçao irmao...
t amo...hauhauhau

Cara Pintada disse...

Olha.... tu melhorou bastante hein!!!
Adorei a parte da estátua da Chapeuzinho e do Lobo... hehehehehe
Sinto um toc de Paulo Coelho ao dizer que "a decisão é minha, se paro e fico para trás ou se continuo andando".
No fim tudo é uma coisa só mesmo. Estou estudando Nietch e estou craque em filosofia... Mas há algo nos teus dizerez que me tocam de alguma forma não sei se é por que acompanhei o teu processo e fiz parte dele por um conciderável tempo, mas têm um "q" de vivo que não tinha e isso me dixa meio eivado de um pouco de orgulho por saber que do outro lado do Atlantico têm uma pessoa que fez parte da minha vida é tenta, de todas as formas, ser melhor. E o que é melhor ainda esta conseguindo! Não esta parado, não fica para trás mesmo quando a lingua, o lugar e tudo parece cospirar "contra", (Prova do conquistador)... realmente fiquei com inveja,não da cervala a um Euro, mas sim de estar aqui parado e ficando para trás. Mas agora sei que sempre podeser pior, posso estar na escuridão mas sei que meus pés irão me guiar...
Forte abraço e te cuida! Qualquer coisa prende o grito que agente leva as panelas!!!!

claudia disse...

Questões que não sabemos as respostas, mas compartilho contigo a insistência em pergunta-las. Como nós dois sabemos, somos apenas seres humanos incapazes de entender o mundo em que vivemos, e disso tudo o que realmente vale a pena. Mas não temos como negar que a coragem que tu tem tido de se manter firme aí te faz enxergar a vida de outra forma, e para mim ela parece bem mais profunda, até a solidão te ascrenta. Nada como ter o que falar...né? Beijos.

claudia disse...

E aí, desistiu da missão? Como andam as coisas por aí? Beijos.

Guardian disse...

A experiência mais incrível que podemos ter é viver em outro mundo que não o nosso, viver no mundo de sempre, o chão onde nascemos, é fácil, mas acreditar na vida longe daqui, fora de nossa "bolha cotidiana", isso é para os que tem coragem.
Tu és uma pessoa única Rafael (como outros já disseram antes de mim), alguém que luta por 'la revolución' e ganha todos os dias, todos os dias...
Te vejo hoje como se estivesses em teu caminho para tornar-se um mago. Seguindo a trilha até Santiago de Compostela. E se não nos vimos mais desde tanto tempo, é porque teus caminhos ainda tem muito onde te levar. Um dia espero te ver por aí, um dia não muito distante.
Abração meu amigo!
Te desejo uma boa jornada.